É sexta-feira, a noite de excelência para sair em Lisboa, segundo Miguel, estudante de Agronomia. Na mesma noite acontece um concerto dos Silence Four, também enquadrado na Semana Académica, que se prevê retirar público aos concertos no Instituto Superior Técnico. Zé Cabra sobe ao palco cedo, talvez demasiado cedo, ainda não são onze horas. Antes disso esteve no bar VIP, onde cumprimentou patrocinadores e organização.
A assistência não é muita, apesar de o (curto) concerto se vir a revelar mais concorrido que o dos Kamasutra ou dos Kane. Entre os grupos que se aproximam do palco existe bastante espaço vazio, muitos estudantes não abandonaram as barraquinhas do arraial, conversando e namorando entre cerveja e shots, vendidos à dezena, a preço especial. Zé Cabra é recebido com boa disposição ("Ganda maluco!") e responde com um sonoro "Boa Noite Rádio Cidade", está visto que audiência oblige. O cantor veste um fato com faixa de lantejoulas encarnadas e a iluminação mostra um rosto cansado e olheirento. Movimenta-se agilmente por todo o palco ("Não metas, não metas, não metas coisas nessa cabecinha, não metas coisas que não são verdade."), e a assistência canta com ele, dando provas de conhecer as letras de cor.
O ambiente tem a mesma energia de um bailarico da aldeia, várias raparigas entram em sintonia com o momento e dançam entre si. Vêem-se alguns copos de cerveja e muitos, muitos caloiros. Demora tempo a chegar o habitual cheiro a erva, fumada algures, entre estes jovens de ar saudável e desinteressante, banais, limpinhos e simpáticos que não parecem perceber que, até há pouco tempo, esta mistura académico-pimba seria algo bem mais improvável. Mas o Big Brother está no ar e não há pudor cultural que lhes valha.
A temperatura sobe com a arrastada "Lágrimas" ("São Lágrimas, são lágrimas.") e o humilde pedido "Mãozinhas no ar, agradecia imenso!", que deixa Margarida, 20 anos, capaz de um desabafo para as amigas "Eh pá, isto é mesmo ridículo!". As três amigas, um dos muitos grupinhos de raparigas que pontuam por todo o recinto (ao lado de grupos similares, e maiores, exclusivamente do sexo masculino) são caloiras mas já perceberam que ".o Zé Cabra está cá só para pôr o pessoal a beber". Pelo que se pode ver, até este momento, o pessoal diverte-se comedidamente, pelo mais pueril divertimento de pular e gritar numa sexta à noite.
O cantor aplica-se ("Passa a noite comigo morena, vai valer a pena, vais ver o que tens andado a perder, sou o homem que te vai fazer mulher") e volta a pedir palmas para a Rádio Cidade. Uns minutos mais tarde é a vez da sua editora "Uma salva de palmas para a minha editora Espacial, é graças a eles e aos estudantes que estou aqui!". Uma boa média final, com cinco músicas para três agradecimentos. Democrático, ao bisar, Zé Cabra deixa aos estudantes a opção "Qual é que querem?" e regista que a música "Lágrimas" é o seu hit estudantil.
Joana Leitão de Barros / Oni, 18/05/2001