«Estou no lugar que mereço»
Foi a fazer bailes por todas as aldeias do distrito da Guarda que Luís Filipe Reis deu o pontapé de saída nas lides artísticas. Tinha então 16 anos e já uma grande paixão pela música popular portuguesa. Cantarolava muitas músicas «tipo José Malhoa», lembra. Na altura comprou uma bateria «muito pobrezinha» e aprendeu a tocar sozinho. Surgiu então a oportunidade de mostrar as suas habilidades em público. O convite veio da parte de um irmão do acordeonista António Júlio. Luís Filipe Reis aceitou e logo no primeiro dia fez um baile. «Recordo-me que em Gonçalo», terra natal de António Júlio. Um duo que viu a sua popularidade aumentar dia para dia. «Quase todos os dias tínhamos um baile», garante o cantor. A sintonia entre eles era tanta que ouviam uma música ao meio-dia e tocavam-na à noite, «sem ensaio». «Coisas muito bonitas que aconteciam entre mim e ele», diz a propósito. Sempre música portuguesa ou cantada em português. «Ouvíamos música estrangeira mas não a tocávamos». Actualmente não sabe do paradeiro do companheiro de tantos bailes mas espera que não tenha deixado de tocar. «Nunca conheci ninguém com o ouvido do António Júlio», argumenta. Falando de si, Luís conta que sempre foi fã do Roberto Carlos e Frederic François, entre outros cantores românticos. Uma linha que sempre seguiu. «O meu bilhete de identidade é cantar canções românticas».
O facto de ser conhecido, ter «uma vida social boa» e dos pais lhe pedirem não foram razões suficientes para o demover de procurar uma vida melhor fora daqui. «Exijo muito de mim», explica. Essa exigência e um telefonema de Abílio Curto conseguem-lhe um passaporte até Paris. «O máximo que ele [Abílio Curto] fez por mim foi muito bom, muito embora não tivesse resultado». Fala com um certo saudosismo do ex-autarca e lamenta que a «pessoa amiga do Abílio» talvez o tenha esquecido. «As pessoas são amigas quando estão presentes. Às vezes esquecem a amizade». Apesar de não querer «estar a escrever um livro tipo Linda de Suza», Luís Filipe não quis deixar de referir que foi com «muita luta e sacrifício» que venceu o desafio. «Gravei o meu primeiro álbum em Paris, depois fui convidado para gravar nos Estados Unidos». Nos primeiros dois anos que se deslocou a Portugal para dar alguns espectáculos, Luís «tinha uma certa vergonha», porque as pessoas lhe diziam que tinha um «espectáculo tão bonito e não era conhecido». «É sempre triste quando não reconhecem o nosso trabalho no nosso país de origem». O terceiro ano correu melhor. Foi convidado para gravar em Portugal. "Obrigado Portugueses" foi o nome do trabalho. Valeu-lhe o primeiro disco de ouro. Sem ir à televisão. «Não havia Mades in Portugal, nem apoio à música portuguesa». Os dois trabalhos posteriores, "Flor Portuguesa" e "Bate Coração", tiveram igual reconhecimento. «Valeu a pena ter saído do meu país e ter alcançado esses êxitos».
Gozar a velhice na Guarda
Da lista de recordações que tem da Guarda, de onde é natural, - «nascido e criado no Bairro de S.Vicente» – consta o nome de Germano Morais. «Estive na casa dele durante cinco anos», conta. Luís Filipe Antunes Reis «fazia uns recados no escritório» do empresário, que ainda hoje considera como «um homem de muito valor».
Mas nem todas as suas recordações são boas. Uma delas foi quando a mãe o deixou. «A inveja das pessoas, pelo facto de ter nascido de uma família humilde e ter conseguido tudo isto com trabalho e talento», é outra. Luís não concorda com quem pensa que só com dinheiro é que se consegue vencer na vida. «Eu não o consegui com dinheiro», até «porque não o tinha». Daí o ter de emigrar. Paris continua a ser o ponto nevrálgico de Luís Filipe, mas sempre que pode dá uma escapadela até à sua terra natal, onde espera vir a gozar a sua velhice. É de opinião de que a Guarda é uma cidade moderna, mas considera que as grandes mudanças não são de agora. «Depois do 25 de Abril a Guarda subiu dia a dia».
Actualmente, «as pessoas que pertencem à câmara, e as que estão a tomar conta da cidade, estão a fazer por ela aquilo que ela merece».
A carreira de Luís Filipe Reis vai de vento em popa. O seu mais recente trabalho, "Esquece o meu nome", valeu-lhe um disco de platina e os primeiros lugares no top nacional de vendas, designadamente no Made in Portugal. O primeiro da sua longa carreira. «Tenho dez anos de carreira como profissional». Sem falsa modéstia afirma: «Estou no lugar que mereço». Além do «salto qualitativo» que o trabalho apresenta, a introdução de uma banda, coristas, bailarinas e todo o suporte técnico, Luís apostou ainda numa mudança de visual. Uma aposta que o «cantor, autor e compositor» fundamenta com uma certa saturação. «Essa moda da música pimba, que eu nunca soube muito bem o que era, começou a entrar comigo e comecei a não gostar». A partir daí, «mudei de visual e dei também a entender que tenho qualidade para poder fazer outro estilo de música» Isto porque, segundo ele, tanto faz este estilo de música como outro. A propósito de qualidade, conta uma história que aconteceu num espectáculo dado na Suiça, junto da comunidade portuguesa. «Quatro ou cinco pessoas de uma rádio acusaram-nos de estarmos a enganar o povo».
Gabriela Marujo / terras da Beira, 14/05/1998
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