quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O que chamam de música pimba é música popular

Bonita e descontraída, Mónica Sintra voltou a animar mais uma emissão de «A Vida é Bela» da TVI. A TVI Online quis saber o que a cantora pensa da música portuguesa e como é recebida pelo público, entre outras coisas. Uma conversa sem pressas.

TVI - O que pensa da música que se faz em Portugal?

Mónica Sintra - Ao contrário do que muita gente possa, eventualmente, dizer, acho que tem qualidade e o facto de haver cada vez mais pessoas novas a cantarem é extremamente positivo. Faz com que exista uma «concorrência» saudável e que se traduz no aperfeiçoamento dos artistas.

TVI - Pensa que com os novos cantores portugueses a música nacional tem sofrido uma evolução?

M.S. - Acho que vai evoluindo aos poucos. Antes tínhamos como modelo os trabalhos de artistas estrangeiros. Consumíamos, e ainda consumimos, muita música estrangeira para termos um modelo de comparação. Hoje temos os trabalhos uns dos outros para comparar e para ver o que podemos melhorar e modificar e isso é que dá a tal evolução.

TVI - Hoje as pessoas têm uma ideia pré-concebida da música portuguesa, considerando-a pimba. O que pensa disso?

M.S. - Isso já surgiu há algum tempo. Como toda a gente sabe, devido à música do Emanuel, «Pimba Pimba». Acho que aquilo que as pessoas conotam como música pimba é algo que sempre existiu e faz parte das nossas raízes. Da mesma maneira que o fado é um estilo de música bem português, aquilo que determinadas pessoas e artistas chamam de música pimba é música popular e é do que as pessoas gostam e consomem.

Não aceito muito bem esse termo... pimba.

TVI- Dá muitos espectáculos por todo o país. Qual é a adesão do público?

M. S. - É óbvio que aquelas músicas mais conhecidas como «Afinal Havia Outra» e «Na Minha Cama com Ela» são sempre as mais cantadas e esperadas, por isso é que as guardo para o fim (risos)! As pessoas têm-me recebido muito bem.

TVI - O que há de melhor no mundo do espectáculo?

M.S. - Andarmos na estrada e diariamente conhecermos pessoas diferentes. O melhor mesmo é conhecer algumas zonas de Portugal que não conheceria se não tivesse esta profissão e, claro, ter o carinho do público.

TVI - E o pior?

M.S. - Não tenho nada de grave e de mau para dizer, até porque a minha música abrange um público de mulheres de uma faixa etária a partir dos 25 anos e também as crianças. Nunca foram desagradáveis comigo.

TVI - Está a tirar um curso de Psicologia. Quando acabar o curso, como vai conciliar a carreira de cantora com uma actividade profissional na Psicologia?

M.S. - Ainda não acabei, de facto é um curso de quatro anos que eu acho que irei fazer em 10 (risos)! Mas isso também não me preocupa muito, porque nesta altura tenho muito trabalho e mesmo que acabassse o curso agora nunca poderia conciliar.

TVI - Quais são os projectos para agora?

M.S. - Estamos numa fase de começar a pensar num novo trabalho. Se bem que este último CD ainda não foi apresentado muito bem em termos de estrada. Os projectos passam só pela gravação de um próximo trabalho, com algum cuidado, se calhar irá demorar muito mais tempo do que todos os outros. A nível mais pessoal, passa por tentar fazer mais cadeiras de Psicologia.

TVI - Costuma consultar muitas vezes a Internet?

M.S. - Costumo consultar para ver os mails enviados por todos aqueles que querem trocar algumas impressões comigo e para fazer pesquisas de Psicologia... dá-me jeito!

TVI - Quer deixar uma mensagem para os nossos cibernautas?

M.S. - Sim... podem mandar-me uma mensagem (monicasintra@hotmail.com). Se, entretanto, a mensagem vier devolvida, não desesperem, mandem-na na manhã seguinte, porque normalmente tenho que despejar o mail à noite. E, essencialmente, que sejam felizes. Procurem fazer alguma coisa de que gostem. Procurem a felicidade!

TVI Online, 14/02/2003

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Nasceu a literatura pimba

Um molho de garrafas de cerveja emoldurando a mesa da esplanada do café de Almada onde conversamos, cabelo comprido puxado para trás, camisa de flanela aberta sobre uma camisa de ganga também aberta e deixando ver uma «sweat-shirt», Nuno Tonelo, 30 anos, confessa-se: «Convenhamos... eu sou tudo menos um escritor... não tenho problema nenhum em aceitar isso.»

Com o 12º ano, um curso de história e cronologia da música em Londres, que ele próprio se apressa a desvalorizar, ex-«disc jockey», ex-luminotécnico e confesso «gigolo», há cerca de um ano, Nuno, até aí um ilustre desconhecido, sentou-se à secretária a escrever durante 48 horas. «Bom, não foram ininterruptas, foram para aí 12 horas e, no outro dia, foi o dia todo.» Nuno, que se habituou a escrever nos dias que lhe corriam mal -- «apanho uma bebedeira e em vez de fazer uma desordem, escrevo» --, derramou um texto mínimo e autobiográfico sobre os seus dias como «gigolo». «Tudo o que lá está aconteceu, só mudei alguns nomes», explica.

A sua namorada da altura leu, passou a computador e pressionou-o a enviar para as editoras. «Enviámos para 20, seis responderam a dizer que não estavam interessadas, a sétima, a Europa-América, decidiu publicar.
O facto de alguém ter decidido publicar o texto já foi suficientemente surpreendente para Nuno. «`Tava à espera de tudo menos que fosse publicado», explica. Género é coisa que não cultiva. «Eu não tenho género porque não sei o que `tou a escrever, vai saindo.» Influências, também não. «Nenhumas», responde, quando lhe falamos em influências literárias, embora afirme nutrir especial afecto pela obra de Mário de Sá Carneiro e Oscar Wilde.

A obra resume-se a 145 páginas impressas numa letra enorme -- «presumo que foi para ocupar espaço» -- que se lêem em 45 minutos e que focam a vida autodestrutiva do «gigolo» Nuno e dos seus amigos noctívagos. Nuno passa a vida a beber Jack Daniels em festas onde está sempre tudo a «partir», até ser contratado por uma agência que serve mulheres casadas que desejam sexo.
O livro inclui descrições de bacanais, diálogos ao telefone e páginas de um só parágrafo como este: «O Jorge telefona-me de manhã convidando-me para almoçar. Aceito, na condição de o almoço ser às três da tarde, e volto para a cama onde estão a Xana e a Teresa.» E é tudo para a página 85.

As descrições das festarolas em casa de amigos, como a Gina, são esmagadoras: «O Luís está em cima da mesa a `comer' a Mónica. O Jonas está à volta do cu da Paula. A Teresa, eu e a Xana já estamos os três embrulhados. Só me lembro que no fim de contas acabei por comer a Clara também, porque o Nuno Rocha caiu de maduro e a Xana e a Teresa resolveram `esfarrapá-la' completamente.»

Telefonemas entre o Nuno e os amigos, há muitos, mas o da página 106 supera tudo:

«-- Tudo bem. Apanha-me às duas e meia.»

«-- Okay. Ouve!»

«-- Sim?»

«- Enquanto tu ficas a dormir, vou aproveitar para seguir o teu conselho.»

«-- Qual?»

«- Vou cagar.»

«-- Tchau.»

Na página 118, Nuno está em casa da Xana a conversar com ela acerca da sua profissão de «gigolo». A cena continua na página 119, Nuno faz uma pergunta a Xana e, na página 120, a resposta de Xana já é feita na praia!

As críticas, todas elas negativas e esmagadoras, não parecem incomodar Tonelo. «`Bada' merda, quero lá saber disso, disseram que eu era uma cópia patética do Brett Easton Ellis, `tou-me a borrifar! Eu recebo 190 paus por cada livro vendido. Acha que por 200 escudos eu me vou preocupar se o livro vende ou não vende?' Tou-me a cagar! Completamente! Tive amigos que gostaram, a minha mãe é que não porque acha que o livro tem uma linguagem baixa e ordinária.»

A incursão de Nuno Tonelo no mundo das letras começou no liceu, sobretudo sempre que se sentia mal com o mundo. Mas foram os dois anos que passou na Marinha e a revolta que sentiu contra o rígido sistema militar que o levaram a escrever em grande quantidade. «Escrevia muito, à resma, mas não se aproveita grande coisa. É uma destilação de ódio completa.» Um dia, transportando um caixote de fruta, escorregou e deixou cair seis peças. «Apanha!», gritou-lhe o cabo. «Apanha tu», respondeu o grumete Tonelo. Resultado: um mês de cadeia por insubordinação e desobediência.
Depois de uma estada de dois anos em Londres, Nuno ainda foi DJ no Café Concerto -- «fechei o Café Concerto» -- até acabar no Casino do Estoril a trabalhar na iluminação de «007» e «Mozart». A carreira de luminotécnico encurtou por causa de umas calças de ganga. «Não podia entrar de calças de ganga e um chefe de mesa pôs-me cá fora.»

A carreira de «gigolo» começou muito tempo antes. A mãe de Nuno trabalhava numa empresa ligada ao Casino. Nuno acompanhou-a numa recepção e uma senhora pensou que ele fosse o «gigolo» da mãe dele. Acabou a trabalhar para essa senhora. «Tem o género de uma agência, que funciona de boca em boca.» Nuno afirma receber então 25 contos por cada serviço e nunca se ter arrependido. «Toda a gente se põe de joelhos, uns põem-se de uma maneira, outros de outra.»

Retirado da profissão -- «ninguém aguenta muito tempo» --, Nuno trabalha agora em montagem vídeo como «free lancer» e afirma estar a preparar uma obra sobre um assassino profissional. Porquê? «Porque é aquilo em que eu tenho medo de me vir a transformar. Não me repugna matar alguém por dinheiro, como não me repugna assaltar um banco, como não tenho nada contra o traficante de droga. É um homem de negócios. O consumidor é um desgraçado.»

PUBLICO, 16/11/1995

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

O Pimba - Um Fenómeno Musical

O Fenómeno Musical "Pimba" - O caso Emanuel
Dissertação apresentada à Universidade Nova de Lisboa para obtenção do Mestrado em Estudos Portugueses (Variante de Culturas Regionais)
Director de tese: Professor Doutor João Ranita da Nazaré

Resumo

O objectivo deste trabalho é fazer uma reflexão acerca de um fenómeno que se veio a difundir em Portugal a partir da segunda metade da década de 90 na área da música ligeira que se faz no nosso país e é ouvida (senão apreciada) por uma grande parte da população portuguesa – o “pimba”. Assim, pretendemos com esta reflexão estudar algumas características desta música, de modo a podermos vir a compreender melhor o fenómeno supracitado.



Entendemos então que, para podermos alcançar os objectivos traçados, é necessário responder a algumas questões relacionadas com aspectos da sociologia da música. Que papel ou papéis pode eventualmente desempenhar esta música na nossa sociedade? Quais as características deste género musical que fazem com que as massas (às quais todos nós, sem excepção, acabamos por pertencer) em certas ocasiões se identifiquem com ele? E as canções incluídas no género musical “pimba” são criadas de acordo com a moda ou elas fazem a moda?

Gostaríamos de salientar acerca deste fenómeno social que verificámos que ao lado de certo tipo de comportamentos que demonstram uma total repugnância por esta música, considerando-a como música sem qualidade ou de qualidade duvidosa, coabitam outros que traduzem a mais fervorosa e quase fanática dedicação e no que diz respeito ao papel que este género de música pode ter, é importante referir que devido ao carácter simples das suas letras, com as quais muitas pessoas se identificam, estas canções chegam a desempenhar um papel como que de catarse social, contribuindo para aliviar as tensões do dia-a-dia e combater o stress característico duma sociedade moderna e onde predomina uma cultura de massa.

Índice

Introdução
1. Problemática
2. Pertinência do estudo
3. Dificuldades
4. Metodologia

Capítulo I – Enquadramento sociocultural
1. Origens e influências na música “pimba”
1.1. Da cultura de massa
1.2. Da cultura Kitsch
1.3. Da cultura tradicional e da canção “popular” portuguesa
2. Um novo estilo: o “pimba”

Capítulo II – Emanuel: o homem
1. História de vida
1.1. Covas do Douro
1.1.1. Os afazeres
1.1.2. As aventuras
1.2. As viagens
1.2.1. Covas do Douro – Lisboa
1.2.2. Lisboa (a casa dos tios) e o regresso a Covas do Douro
1.3. Lisboa (novos contactos)
1.3.1. O Paris Orly
1.3.2. A Escola de Música Duarte Costa
1.3.3. O futebol, o Atlético e o Sporting
1.4. As férias
2. Actividade artística
2.1. O professor Américo
2.2. O arranjador/orquestrador
2.3. O cantor (Américo Monteiro/Emanuel)

Capítulo III – O repertório
Aspectos musicais e literários
1. A criação musical
1.1. A forma
1.2. Os ritmos
1.3. As melodias
1.4. As harmonizações
1.5. As instrumentações
1.5.1. Os instrumentos
1.5.2. Os ensembles e os conjuntos instrumentais
1.5.3. As vozes e os conjuntos vocais
2. A criação dos textos
2.1. Os temas
2.2. O vocabulário
2.3. A métrica
2.4. A rima

Capítulo IV – A performance musical
Os espectáculos
1. Os espaços e o tempo
2. Os participantes
2.1. Os artistas
2.1.1. A “vedeta”
2.1.2. Os músicos
2.1.3. O coro
2.1.4. As bailarinas
2.2. O staff
2.2.1. Os agentes
2.2.2. A equipa de som e luz
2.3. O público
3. A imagem
3.1. O vestuário
3.2. As coreografias

Capítulo V – Registos sonoros e recortes de imprensa
1. Registos sonoros
1.1. A gravação das canções
1.2. Os trabalhos editados
1.3. A promoção e a divulgação
1.4. Os destinatários
2. Recortes de imprensa

Conclusão

Bibliografia e discografia
1. Bibliografia citada
2. Bibliografia consultada
3. Bibliografia da música “pimba” relativa ao caso Emanuel
4. Discografia consultada

Anexos
1. Transcrições musicais e literárias do corpus do trabalho
2. Outras transcrições musicais e literárias
3. Grelhas de registo dos dados para análise
4. Legenda das imagens utilizadas ao longo do trabalho
5. Exemplos musicais e literários referidos ao longo do trabalho (1 Cd)
6. Corpus do trabalho (2 Cds)


Francisco Manuel Marques
http://clientes.netvisao.pt/fmm65b/textos/Tese.htm
http://clientes.netvisao.pt/franci03/textos/Tese.htm


Lançamento do livro "O Pimba - Um Fenómeno Musical"

Apresentação pública em Beja no dia 25 de Maio de 2006, pelas 18.00 horas, no BejaParque Hotel, integrado nas Festas do Concelho.


O Pimba Um Fenomeno Musical - Francisco Manuel Marques (Editora: Setecaminhos / Colecção: Extra Setecaminhos)