Com as digressões estivais de música pimba podemos nós bem. Aliás, só vai a essa espécie de concertos («festarola» talvez seja um termo mais exacto) quem quer, o público aparentemente diverte-se à séria e, afinal, a grande maioria dos artistas pimba mai'los organistas todos também não exigem serem tratados como grandes expoentes da nossa música popular. Pode ser um sintoma preocupante que se consuma tanta música pimba comparativamente com as vendas de outros discos, mas esse é um fenómeno global e há aquele argumento a que dificilmente se consegue responder: cada um ouve o que quer. Ora bem, nem mais. Cada um ouve o que quer e a mais não é obrigado, por isso dê-mo-nos por satisfeitos por, pelo menos, ainda podermos escolher e passar ao lado da música pimba se assim o entendermos. Mas não é sobre música que eu quero falar (sobre «dar música» talvez sim).
Mais grave do que usar um palco para, em play-back, gritar rimas brejeiras e ensinar umas coreografias ridículas (entre uma morena meio vestida e uma loura meio despida) é usar o mesmo palco para pegar num microfone e fazer um comício político, em formato pimba. OK, nós já descobrimos que nos comícios, sobretudo perto de eleições, dramatiza-se muito, fazem-se promessas sem ter a certeza de as poder cumprir, simplificam-se questões complexas. Mas a isso chamaria apenas um dos lados menos brilhante das democracias, o tal pior de todos os sistemas com excepção de todos os outros, nesta transição de século e milénio. Política pimba é o que um tal Alberto João Jardim e um tal Jaime Ramos fizeram em comício partidário na ilha da Madeira. A estratégia da política pimba é bastante simples: basta marcar encontro com um mar de gente e dizer o que lhes dá na gana para atacar os adversários e defender os seus (deles) interesses. Desta vez informou-se o povo de que os grande homens de esquerda deste país são cúmplices dos grandes traficantes de droga e defendem o seu negócio. O povo, algum povo, há-de reter a informação: os comunistas estão feitos com os traficantes! Faz lembrar a acusação, muito popular por estas terras do interior, de que os comunistas é que provocavam os incêndios. Para terminar em festarola sem estragar o nível em que se tinha iniciado conclui-se a mensagem política ao povo da Madeira: Lisboa está dominada pelos lobbys dos gays, da droga e da comunicação social. Venha o diabo e escolha. O grande inimigo a abater para o Sr. Alberto João e o Sr. Jaime, suponho, deve ser um jornalista gay que consome drogas.
É difícil descer mais baixo em demagogia e hipocrisia. Mas na desinteressante vida política actual do país essas são as estratégias que mais colhem. E a direita (ou, se quiserem, a oposição) tem-se esforçado por isso. Paulo Portas dum modo profissional e eficaz, Durão Barroso dum modo indeciso, inseguro e amador, o Sr. Alberto João do modo pimba e rasteiro. A questão da droga é, de facto, um bom exemplo. Tenta-se, por agora, descriminalizar o seu uso. Ou seja, adaptar a lei ao que já se passa nos tribunais enxameados de casos ligados à droga: condenar quem está ligado ao tráfico mas não encher salas de audiências e prisões com acusados por consumir. O problema da droga é sobretudo económico (e social). Gente com vontade de usar substâncias que interferem com os sentidos houve nas mais diversas épocas e civilizações. Vamos, já agora, meter na prisão ou multar todos os viciados em comprimidos para dormir? Outra questão exemplar neste domínio é o aborto. Em nome do direito à vida defende-se ferozmente que as coisas se mantenham como estão: todas as mulheres que o querem fazer podem abortar, mas clandestinamente nas condições possíveis (e sem qualquer controlo sanitário) ou no estrangeiro. Às escondidas é muito mais ético, de facto.
E eu posso afirmar em tribuna pública que o Sr. Alberto João e o Sr. Jaime Ramos estão feitos com os............?
Pedro Dias de Almeida
Jornal O Interior 04/08/00